29 de fevereiro de 2012

comme un ogre

(foto: carlos silva)

***
"Comme un ogre"

La foule serrée et brulante
comme la bouche d’un ogre vorace
tous ces corps qui touchent mon corps
j’ai peur d’être avalée
broyée
digérée
je lève les yeux et je m’échappe
sur les ailes d’un avion de papier
là-haut
très loin
je caresse les nuages
comme si c’était les cheveux du ciel
je les tresse
j’en fais un nid
un endroit doux où me cacher
en attendant que la foule
desserre les dents et
recrache mon corps

***


*

como um ogre

A multidão compacta e ardente
como a boca de um ogre voraz
todos estes corpos que tocam o meu
tenho medo de ser engolida,
triturada
devorada
levanto os olhos e escapo
sobre as asas de um avião de papel,
lá em cima
muito longe
acaricio as nuvens
como se fossem cabelos do céu
entranço-os
construo um ninho
um lugar doce onde me esconder
esperando que a multidão
descerre os dentes
e cuspa o meu corpo.

*

[trad: cas]

25 de fevereiro de 2012

não tenho chão às vezes

(foto: carlos silva)

***

Não tenho chão às vezes



Sem chão não vejo não sinto os pés
Caminho numa calçada sem calçado
Nus os membros inferiores que me reduzem
à locomoção sem locomotiva

Já fiz remover terras sobrantes entre
Entre os dedos que se fazem precipício

A estrada é sempre uma forma de prolongar
o que não sabemos

Não tenho chão às vezes
nem uma nesga de voo se a inquietação me pede
levantamento

Ando corro caio deslizo
O passo é qualquer coisa pensável
mais do que incerteza
paisagens
cosmos de dentro

Não tenho chão às vezes
Sou destituída de trilhados
Amante de névoas

Nublado está o córrego

Entrego os meus passos
ao corpo que me leva
andante.


21 de fevereiro de 2012

a certa idade

(foto: carlos silva)

***

a certa idade

a certa idade
unha idade avanzada
a mulher olha e ve o mundo
o seu mundo en branco e negro
que ela perdeu un pouco de vista

a certa idade
unha idade algo avanzada
esta mulher olha e ve o presente
o seu presente e pasado algo borrosos
que ela perdeu un pouco da sua memoria

a certa idade
unha idade ben avanzada
esta mulher axúdase dun bastón
bastón para percibir mellor o mundo
as formas as tres cores os sabores os olores...

a certa idade
unha certa idade ben avanzada
aínda que todas as idades son certas
a man desta mulher segue caminhando
para completar nun lonxano dia o seu círculo




17 de fevereiro de 2012

talvez os polegares não desviem as águas

(foto: carlos silva)

***

talvez os polegares não desviem as águas
dobradas pelas raízes
em conversas a fio

pensava nela a regressar das raízes pelas mãos
de como se lembra de toda a água que já foi
e se ouve ainda o fechar da maré
em cada rotação dos seus olhos

ouvia repetidamente
divide a luz se te atreves
e talvez aí a sombra

cada célula
grávida de um segredo:

não espero da água
o que espero de mim
que no código de vez em quando
tenha sobrado um verso:

pode levar-se uma pergunta ao infinito
ou dar-lhe um beijo



13 de fevereiro de 2012

no pétreo leito, entre os raís

 (foto: carlos silva)

 ***


No pétreo leito, entre os raís

Porque son unha muller cuberta de resío
agardo o solpor espida
Abrazada a un interminábel fado
impávida
Coma unha inanimada estatua de sal
proxectada cara as vías
dende as xanelas brancas de aluminio
Contémplame! Veño dun naufraxio
Levo gárgolas de pánico na mirada
Acoitelo bágoas cos dentes
e emprendo traxectos incertos
Intúo que as memorias
québranme coma un vimbio, feble de humidade
Póusanseme nos labios folerpas
e os lobos dos recordos esgárranme a carne
Son unha faquir esmorecida
enriba dos camiños de ferro
Fágome a durmida
e o zunido do vento rínchame nos dentes
A chuvia desintégrase en ínfimas partículas
e morre aterecida
no pétreo leito, entre os raís

O reloxo vai cara atrás e o algarismo é un epitafio
que sucumbe baixo un convoi de mercancías 


Cruz Martínez Vilas

9 de fevereiro de 2012

nas aresias dos painéis

(foto: carlos silva)

***

nas aresias dos painéis


as intermitências dos lugares clarificam as obtusas escarpadas nos céus auspiciados dos miolos- uma espécie de licor corporiza os meandros nas lascas das miscigenadas alucinações do diurno espasmo da vivência - soerguem-se os pioneiros no mundo esquecido, no suspense das bruxarias, os quartos vicejam um cardume de pianos no quintal despido- nas letras das rosas- corais de desentendimento farejados nos acordes do magma silencioso- uma delícia- nadam os esgotos nas franjas do esporão dos anjos, realizam-se solicitudes entre as panelas do paraíso e no oceano das lanternas mortas durante as libélulas dos sorrisos - muitos dias tardam e remetem para os sussurros das mentiras servidas apressadamente nos cafés da insónia - talvez acredite que não te conheço - velam-se os domínios esotéricos das hipóteses estendidas nos hangares da flutuação estonteante da adrenalina - talvez acredite mesmo que não te conheço - migrações frustradas no diapasão dos eflúvios - tão perto de ti - com tampores estrebuchando nos mortos alocados - nado à volta, nas arestas dos painéis, nado à volta, na distância do meu caminho e quando falo com as pestanas doridas do entrudo, atravesso os pinhais intermitentes dos lugares clarificados nos oceanos obtusos dos ceús escarpados - nos miolos -

Carlos Vinagre

5 de fevereiro de 2012

clímax

(foto: carlos silva)

***



Hai baixo as pálpebras de carbón
un mar de amargura diluído nas meniñas
que voan na soidade dun ceo toldado
cara un horizonte incendiado de esperanza
onde o sol prende insolente unha lareira,
lume de áurea nun sorriso que arde,
que lanza en coraxe a súa dentaina de escume,
que brinca incesante de ondaxe en bravura
contra os seres de area que soñan coa lúa chea.

Hai un mar salvaxe de inmensidade plena
que enche mareas crispadas de escume,
avanza imparábel co vento dos tempos
e asalta en cada avance un aturuxo.

Hai un mar que ama, en combate
coa mesma ilusión que no horizonte desafía.

*

Alfonso Láuzara 





1 de fevereiro de 2012

a calcinación da torrada

(foto: carlos silva)

***


a calcinación da torrada
verquendo frangullas sobre o leite aínda morno
que sosterá da salgada ferruxe das mareas

as engurras das mans
o xabón até os pulsos espidos
a auga a correr
conformando o manto proletario

aló
    o mar
tan perto e tan lonxe
dende os cumios de ferro
os guindastres dos que desprenderse e caer
espirse da calor do lume da soldadura
do contacto da pel núa sobre o ferro candente
e máis
un petisco
    no alto
observando como o sol apaga o océano

*

Alberte Momán